Facções 'EUA' e 'Okaida' dominam escolas de JP
Levantamento do MP constata atuação de gangs em pelo menos 10 escolas da capital
Estudantes de escolas públicas localizadas em João Pessoa estão
deixando as instituições por medo da violência provocada pela atuação de
facções criminosas no interior dos colégios. De acordo com um
levantamento realizado pelo Ministério Público Estadual (MPPB), através
da Promotoria da Infância Infracional, o problema está acontecendo em
escolas instaladas em pelo menos dez bairros da cidade. Ainda segundo a
denúncia do órgão, professores e funcionários do colégio também são
intimidados pelos alunos envolvidos com os grupos.
Um dos bairros em que a Promotoria da Infância Infracional
identificou a atuação de grupos criminosos nas escolas públicas é o
bairro dos Ipês. Aos 14 anos, Bruno (nome fictício) é usuário de maconha
desde os 9 e alega pertencer ao grupo EUA (Estados Unidos). Apesar do
envolvimento prematuro com entorpecentes, o garoto conta que há cerca de
um ano não tem comparecido às aulas com assiduidade e prefere “ficar na
rua”, conforme relatou em depoimento à titular da Promotoria, Ivete
Arruda.
“Ele sempre tirou boas notas e passava por média. Depois que começou
andar com esses meninos, ficou assim. Se ele for para a escola, corre o
risco de ser pego pelos outros”, lamentou a mãe do garoto, que preferiu
não se identificar.
A situação de Bruno é a mesma relatada pela maioria dos adolescentes,
principalmente os da faixa etária dos 14 aos 17 anos, que são atendidos
na Promotoria da Infância Infracional.
Repetência e idade inadequada para a série que frequenta, além do
abandono escolar, está entre o perfil dos jovens que chegam à
Promotoria. Segundo Ivete Arruda, o principal fator para que os
adolescentes fiquem longe da escola e até impeçam outras pessoas de
estudar nos locais é a participação deles em facções criminosas.
“Como eu faço o acompanhamento deles, eu preciso saber se eles estão
na escola. Mas, eles dizem assim: 'como é que eu vou estudar se eu faço
parte de uma facção e quem domina é a outra facção e eu não posso entrar
na escola? Se eu for para a escola, serei assassinado'. Então, eu tenho
esses casos com adolescentes que moram em Mandacaru, Valentina,
Mangabeira, Rangel e as escolas sabem, a Secretaria de Educação sabe e
precisamos fazer alguma coisa. Ou o tráfico vai controlar as escolas?”,
questionou.
Ainda segundo o levantamento da Promotoria, escolas localizadas em
Cruz das Armas, Geisel, Tambiá, Centro e Jaguaribe também sofrem com o
mesmo problema da atuação de gangues. Em uma das escolas visitadas pela
reportagem no bairro de Cruz das Armas, rabiscos nos muros da
instituição com a sigla “OKD” (Okáida) identificam qual o grupo que atua
na área.
Mais que um símbolo, as pichações e hábitos de alguns alunos
amedrontam também funcionários e professores e se refletem na falta de
alunos da escola.
Em uma das escolas identificadas pela Promotoria, no bairro de
Jaguaribe, o medo da violência e de conflito dentro e nos arredores da
escola mudou a rotina de quem precisa estudar.
Desde o ano passado, a unidade de ensino funciona somente no período
da manhã e na estrutura que tem capacidade para abrigar até 500 alunos,
estão matriculados apenas 250.
Funcionária ameaçada de morte.
Dividida entre o profissionalismo e a preservação da própria vida, uma
das funcionárias da escola no bairro de Jaguaribe revela que foi
ameaçada de morte e levou o caso ao Ministério Público Estadual. Ela
conta ainda que o uso e o tráfico de drogas na área externa da escola é
frequente. Além disso, alguns adolescentes foram pegos portando armas.
"De certa forma, eu me aliei a eles. E se hoje eu estou em paz é por
causa disso. Se eu não tivesse feito isso, talvez hoje eu não estivesse
aqui”, disse. Segundo a funcionária, há alunos na escola, entre 10 e 17
anos, que são “aviõezinhos do tráfico” e intimidam os demais e
funcionários para que não denunciem à polícia.
“Aqui tem o grupo 'Okáida' e 'Estados Unidos' e eles moram na mesma
comunidade e os problemas que acontecem lá se refletem aqui dentro,
comigo e com os outros funcionários. O pessoal de fora não vem estudar
aqui por causa disso, da violência. A escola precisa e sobrevive de
alunos. Sem eles, a escola não existe”, lamentou a funcionária.
Katiana Ramos
JPB
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