Um ano depois, protestos perdem força e clima de Copa domina as ruas do País
Movimentos recentes, menores e mais localizados, foram protagonizados por setores trabalhistas
Por R$ 0,20, São Paulo foi às ruas em junho de 2013.
O que começou como um protesto por causas definidas, a redução das
passagens de ônibus, tomou proporções nunca antes imaginadas e ganhou
desde avenidas a prédios públicos e vielas de todo o País.
Aos discursos, foram
acrescentados pedidos de “saúde e educação padrão Fifa”, fim da
corrupção, derrubada da PEC 37 e transporte de qualidade. Somaram-se aos
mais variados motes, expressões e reivindicações que clamavam por
urgentes mudanças.
O clímax dos protestos aconteceu entre 17 e 20 de junho de
2013. Há um ano, mais de 1,25 milhão de pessoas participavam de
manifestações em mais de 140 cidades brasileiras.
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A repressão policial
marcou os primeiros protestos, no início daquele mês de junho, e
inflamou a multidão que pedia transporte público de qualidade e
gratuito. No protesto do dia 13, na avenida da Consolação, em São Paulo,
mais de 200 pessoas foram detidas e 11 jornalistas ficaram feridos.
Os atos pacíficos dos manifestantes foram quebrados pela violência de
pessoas mascaradas, intituladas black blocs. O quebra-quebra, liderado
pelos manifestantes com rosto encoberto, afugentou e intimidou parte dos
brasileiros que retiraram o apoio aos protestos.
Segundo pesquisa CNT/MDA, divulgada em novembro do ano passado, a
atitude dos mascarados foi rejeitada por 93,4% da população. A última
"atuação" dos Black Blocs ocorreu, em meados de junho, quando vândalos
depredaram concessionárias de automóveis de luxo em São Paulo.
Respostas
O governo parece ter demorado a entender e “ouvir as vozes da rua”. A
presidente Dilma Rousseff foi à televisão, dias depois dos embates,
para anunciar os cinco pactos nacionais, por mais responsabilidade
fiscal, reforma política, saúde, transporte e educação (veja o andamento
das propostas na arte abaixo).
O descontentamento com as políticas públicas foi medido em números:
praticamente todos os governantes, em todas as esferas, registraram
queda de popularidade.
Pesquisa Datafolha realizada em março de 2013, três meses antes de o
movimento tomar as ruas do País, mostrou recorde de popularidade da
presidente Dilma. À época, 65% dos entrevistados avaliavam seu governo
como ótimo ou bom. Ao final de junho, a popularidade havia despencado
pela metade: apenas 30% de aprovação. Um ano depois, a recuperação é
lenta, Dilma tem o apoio de apenas 33% dos eleitores.
Um ano depois, o efeito das manifestações ainda é incerto. Para o
professor de direito da FGV (Fundação Getulio Vargas) e estudioso do
fenômeno Ivar Hartmann, os protestos ensinaram aos brasileiros como se
unirem.
— O maior legado é os brasileiros voltarem a perceber a importância
de se manifestar — perceberam com Collor e depois pareciam ter esquecido
— e terem certeza de que isso dá resultado. Quando as pessoas se
uniram, conseguiram rapidamente o que precisavam: os preços das
passagens baixaram rapidamente, o governo criou projetos de reforma
política.
Novos movimentos
Novas manifestações ganharam as ruas do País antes do início da Copa
do Mundo e greves mobilizaram trabalhadores do setor de transportes —
estopim das manifestações do ano passado. O movimento foi engrossado por
professores e funcionários públicos.
Em menor escala, os protestos chamaram a atenção da população e das
autoridades mas não tomaram as proporções dos protestos de uma ano
atrás. E não devem tomar, segundo o historiador da UnB (Universidade de
Brasília) Carlos Vidigal.
— Se verificarmos, as duas últimas semanas [antes do início da Copa]
foram mais tranquilas. Os movimentos mais radicais foram os dos
sindicatos, das categorias trabalhistas mais mobilizadas. Provavelmente
as pessoas estão mais empenhadas em acompanhar a Copa do que
propriamente realizar os protestos.
O professor da FGV discorda e acredita que a repressão conseguiu minar a força dos manifestantes.
— Os mesmos manifestantes de antes continuam certos de que "aceitar" a
Copa agora não traz nenhum benefício e apenas legitima o dinheiro mal
investido. Em algumas cidades, as manifestações arrefeceram porque a
polícia recebe ordem de supressão total, mesmo quando não há qualquer
traço de vandalismo ou violência por parte dos protestantes.
Para Hartmann, os manifestantes dos dois períodos — junho de 2013 e
junho de 2014 — aproveitaram os olhos do mundo voltados para o Brasil
para anunciar as suas reivindicações.
— É sempre uma questão de timing. Os protestos de junho de 2013
coincidiram com a Copa das Confederações por um motivo óbvio. Os grupos
têm uma determinada demanda e vão manifestá-la sempre no momento que
proporcionar maior atenção e que os colocar em melhor posição para
negociar.
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