Implementação do Código Florestal ainda é desafio, dizem ONG
O Código Florestal (Lei 12.651/12) completa três anos no dia
25 de maio, mas ainda enfrenta alguns desafios para a sua efetiva
implementação, segundo estudo coordenado pela Iniciativa de Observação,
Verificação e Aprendizagem do CAR (Inovacar), promovida pela Conservação
Internacional (CI-Brasil), com apoio do WWF-Brasil, integrantes do
Observatório do Código Florestal.
Cristiano Vilardo, da CI-Brasil, explica que o estudo foi feito com
21 estados entre os meses de março e maio deste ano. Entre os problemas
relatados pelos gestores estaduais do Cadastro Ambiental Rural (CAR)
está a resistência de alguns setores produtivos e a dificuldade em
acelerar o cadastramento, com qualidade, para que outros instrumentos do
código também se desenvolvam.
Criado pelo Código Florestal, o CAR serve como um banco de
informações sobre os imóveis rurais. O cadastro reúne dados como a
delimitação das áreas de proteção, reserva
legal, área rural consolidada e áreas de interesse social e de
utilidade pública. No início do mês, o governo prorrogou por um ano o
prazo para os produtores rurais fazerem a inscrição no sistema.
“A própria prorrogação do prazo, por mais que estivesse prevista em
lei, mostra o tamanho do desafio que é completar o cadastramento até
maio de 2016. E identificamos focos de resistência, de setores inteiros
que não se reconhecem no CAR e não estão apostando na existência do
cadastro como ferramenta”, disse.
Segundo ele, os estados, entretanto, têm sua parcela de
responsabilidade quando adiam a edição de critérios dos programas de
regularização ambiental. “Para convencer os produtores a fazer o
cadastramento é preciso colocar o total do pacote. Apenas quatro estados
instituíram o Programa de Regularização Ambiental [PRA] e só a Bahia
fez a regulamentação. Então o proprietário rural não tem clareza das
regras às quais ele vai estar sujeito para fazer a regularização.
Diferentemente do CAR, que teve um prazo de espera por uma norma
federal, o PRA não, ele é dos estados, que precisam tomar a liderança
disso e desenvolver suas normatizações”, explicou Vilardo.
“Em geral falta uma estratégia mais coordenada, às vezes faltam
recursos, acesso a dinheiro, condições de infraestrutura. Mas,
fundamentalmente, no caso da elaboração de PRAs, falta vontade política,
falta querer fazer, porque não tem custo nenhum nisso”, argumentou o
representante da CI-Brasil.
Segundo o diretor-geral do Serviço Florestal Brasileiro, ligado ao
Ministério do Meio Ambiente, Raimundo Deusdará, os estados precisam
aumentar suas estratégias de adesão ao CAR. “Por parte do governo
federal, do Serviço Florestal e Ministério do Desenvolvimento Social,
estamos construindo estratégias diferenciadas para buscar produtores nas
regiões mais distantes, com foco na agricultura familiar”, explicou.
Outra reclamação é em relação às questões financeiras e carência de
pessoal e infraestrutura. Segundo Cristiano Vilardo, o CAR é um
instrumento que veio adicionalmente às atribuições que os estados já
tinham e está sendo absorvido pelo orçamento já existente. “Os recursos
disponibilizados pelo governo federal, que não são montantes
desprezíveis, boa parte desse dinheiro ainda não conseguiu chegar aos
estados por diversos motivos, seja pela burocracia ou a própria demora
do projeto estadual para captá-lo. Alguns estados têm estrutura
descentralizada, o que tem facilitado o processo.”
As imagens de satélite do Sistema Nacional de CAR também são
insuficientes para ter com precisão o desenho de algumas áreas a serem
cadastradas, segundo o estudo da Inovacar.
Andrea Azevedo, do Instituto de Pesquisa Ambiental da
Amazônia, também integrante do Observatório do Código Florestal, disse
que uma das preocupações da entidade é com a falta de transparência dos
dados do cadastro. “Não é falta de transparência só para a sociedade, é
também para os próprios estados, alguns deles não têm base própria,
municípios que querem acompanhar e não conseguem. Hoje só o governo
federal tem esses dados e os números são apresentados sobre uma base
defasada, que é o Censo Agropecuário de 2006. Então, Mato Grosso, que
tem na realidade 50% das propriedades com CAR, está aparecendo com 90%.
Isso tem que ser corrigido, não é o problema principal, mas sim eles [os
dados] não estarem disponíveis”, disse.
Segundo Andrea, essa falta de transparência dificulta o controle
social do que ocorre onde há sobreposição de áreas, por exemplo, assim
como dificulta o acompanhamento das potencialidades do CAR e do uso do
solo.
A validação desses dados será outro desafio, segundo Cristiano
Vilardo, já que o módulo de cadastro não impede registros incompletos.
“Há certa opção por fazer o povoamento da base de dados o mais rápido
possível, mas nada impede que o proprietário declare uma área vazia,
independentemente se ali deveria ter reserva legal; até que essa área
seja validada ela está inscrita no CAR”, disse ele, explicando que
existe a preocupação com a demora no tempo de validação, considerando a
escassez de pessoas e infraestrutura. “Quem está preocupado com a
regularização tem pressa, isso é um problema muito sério”, completou.
Segundo Raimundo Deusdará, o Ministério do Meio Ambiente está
finalizando o módulo de validação do sistema. Ele conta que o módulo
passou por três meses de testes em cadastros reais e logo será
implementado em Mato Grosso. “Funciona como uma malha fina do Imposto de
Renda, com varias análises como sobreposição com áreas indígenas, com
unidade de conservação, com áreas embargadas pelo Ibama [Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis], com
assentamento fundiários. E o módulo é para validação de todos os
cadastro declarados, o CAR não vai trabalhar por amostragem”, explicou.
Para o diretor-geral do Serviço Florestal, é importante deixar
claro para o produtor que o CAR vai permitir a regularização da
propriedade. “Existem alguns benefícios do Código Florestal que vão se
encerrar daqui um ano, se o imóvel não for cadastrado ele poderá não ter
penalidade, mas perderá o crédito financeiro em 2017, e perderá alguns
benefícios que já estão contidos no novo código, como a adesão ao PRA e o
uso da regra do Artigo 61-A [da Lei Lei 12.651/12] a chamada regra da
escadinha. É um instrumento importante até para mostrar aos mercados
compradores que é possível produzir conservando o meio ambiente”,
explicou.
Raimundo Deusdará disse ainda que para o governo federal esta
avançando na questão dosinstrumentos econômicos, no decreto que vai
regulamentar as cotas de reserva ambiental. “Será um título nominativo
que vai remunerar aquele produtores cujos imóveis tenham excedente de
reserva e que possam ter uma renda adicional relacionada à emissão
dessas cotas. É para valorizar os produtores que tenham ativos e
valorizam a floresta em pé”, disse.
Segundo ele, a expectativa é que o marco legal e a fase de testes
do módulo no sistema, de emissão, registro e controle das cotas, esteja
pronto até o início do segundo semestre deste ano.
Para Cristiano Vilardo, da CI-Brasil, “o que o CAR vai ser no
futuro ninguém é capaz de prever, que ele é potencialmente uma
ferramenta revolucionária todos temos essa confiança. Mas ele pode virar
um elefante branco se não conseguirmos fazê-lo ter a qualidade que
precisa”, disse.
O estudo da Inovacar foi apresentado esta semana em seminário
organizado pela Frente Parlamentar Ambientalista sobre os três anos do
Código Florestal, na Câmara dos Deputados.
Agência Brasil
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